quarta-feira, 31 de outubro de 2007

Livro da Vez: A Familia Frank que Sobreviveu - Gordon Frank Sander

Não adianta. A segunda guerra mundial é um acontecimento que, não importa o quanto eu leia ou quantos filmes a respeito eu assista, eu não consigo entender. Como pode ter sido possível um governo de um país civilizado e desenvolvido deliberadamente exterminar milhões de pessoas? Milhões de pessoas inocentes, cujo único crime era pertencer a uma religião específica.

Este livro fala sobre a experiência de uma família de judeus alemães durante a segunda guerra. Essa família fugiu para a Holanda quando Hitler assumiu o governo alemão. A decisão de fugir foi tomada na hora certa, mas para o lugar errado, já que alguns anos depois a Holanda seria anexada ao Reich. O título do livro faz analogia à família de Anne Frank. Que, de maneira semelhante à família retratada no livro, fugiu para a Holanda e, quando a Alemanha conquistou a Holanda se escondeu na clandestinidade. A família do livro sobreviveu, ao contrário da de Anne Frank (da qual só sobreviveu o pai). Anne Frank é conhecida por ter deixado um diário contando suas experiências naquele período conturbado. Tal diário é leitura obrigatória em escolas aqui na Europa. Talvez isso contribua para que algo do gênero não volte a acontecer. Talvez.

Aquela guerra teve um impacto sobre a Europa que ainda hoje se pode sentir. Certa vez, no ônibus, eu não sei nem por que, mas um senhor italiano começou a gritar e xingar um outro cara de fascista. E a dizer que os estrangeiros trabalham e ajudam a Itália a ser o que é. Eu imagino que o tal cara tenha tomado alguma atitude preconceituosa contra algum estrangeiro. O fato é que o tal senhor estava indignado e chamou o cara de fascista e desatou a falar de todos os males que o fascismo causou aos italianos. Outro dia, tomando cerveja com amigos na Piazza Duomo, um senhor de certa idade chegou na nossa mesa perguntando se sabíamos que o fascismo ainda existe na Itália. Respondi que achava que não, que era coisa do passado. Ele, meio indignado, procurou justificar a nossa "ignorância" dizendo algo como: "hmpf, não são italianos, não sabem de nada..." Alguns dias depois, vendo no Le Iene uma reportagem sobre quem seria a "madrinha dos caminhoneiros" da Itália, um dos caminhoneiros entrevistados não tinha nenhum pôster de mulher nua ou seminua na boléia. Mas tinha um pôster do Mussolini. Aquilo me fez pensar que talvez o velhinho paranóico que veio falar conosco na Piazza Duomo tenha alguma razão. Espero que não. Ainda vou ler algum livro italiano sobre fascismo. Já me indicaram "O Jardim dos Finzi-Contini" de Giorgio Bassani e "Cristo parou em Eboli" de Carlo Levi.

Eu gostei do estilo de narrativa de "A Família Frank que Sobreviveu". Ao mesmo tempo que descreve o drama da família, o livro apresenta a situação econômica, política e militar da Europa no período. Em especial, claro, da Alemanha e da Holanda que são o insólito pano de fundo do relato. Detalha bem o período de depressão econômica e hiper-inflação vividos pela Alemanha após a primeira guerra e que ajudam a explicar o inexplicável da segunda.

Vale ressaltar que o autor do livro é neto dos pais da tal família Frank, e filho de uma das moças que viveram o drama na Holanda. Ou seja, o autor também é um membro da família Frank. Felizmente em um período mais recente. Eu não li "O Diário de Anne Frank". Mas acho que deve ser um belo livro que lerei quando tiver oportunidade. Provavelmente seja até melhor que este livro que estou recomendando aqui, já que é um relato "ao vivo", de alguém que estava lá. Mas só lendo o diário pra saber. Só sei que "A Família Frank que Sobreviveu" é uma ótima leitura.

"A Família Frank que Sobreviveu" no






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quarta-feira, 17 de outubro de 2007

Paulo Autran

Morre um grande artista. Fiquei sabendo segunda-feira pela minha esposa que havia morrido esse grande cara (às vezes as notícias do Brasil demoram a chegar aqui). Pra mim ele era o melhor ator do Brasil. Além de ter uma personalidade admirável. O tipo de pessoa que diz o que pensa e não se preocupa com o que os outros vão pensar ou dizer. Nesse sentido ele era parecido com o Nelson Piquet, outra personalidade que admiro.

Uma pena eu não ter tido a oportunidade de vê-lo no teatro. Quando eu morava em Campinas, a cada peça dele que estreava em São Paulo eu dizia: "Putz, esse mês não dá. O Paulo Autran vai acabar morrendo e eu não vou ver uma peça dele..." Dito e feito.

Uma grande demonstração de personalidade de Autran foi, depois da novela "Sassaricando" ele ter dito que não aguentava mais fazer papel de débil mental na televisão e que nunca mais faria novelas (e nunca mais fez). O cara tem que ser muito ator pra dizer isso e cumprir. E ainda assim ser reconhecido como um grande ator pela TV Globo, a grande central das novelas brasileiras. Novelas aliás que em geral eu acho um lixo, salvo raríssimas exceções.

Outra coisa que eu vi ele dizer, se não me falha a memória naquele programa de entrevistas do Abujamra na TV Cultura, foi a frase: "Deus é o Papai Noel dos adultos". Não é qualquer um que diz uma coisa dessas. Ainda mais na idade que o cara já estava. Aí vem o tal de Juca de Oliveira no funeral do Autran com aquele discurso manjado de que "Isso foi uma passagem apenas. Ele deve estar lá organizando espetáculos para fazer no céu." Nem o Autran acreditava e nem eu acredito nisso. E acho uma falta de respeito (ou de conhecimento) o tal de Juca falar isso no velório dele. Felizmente nenhum outro ator que deu depoimento aqui falou bobagens nesse sentido. Talvez por conhecerem o cara que estavam velando.

Nota: O programa do Abujamra na TV Cultura chama-se Provocações e, na minha opinião é bem melhor que o Programa do Jô (pelo menos atualmente, na época do Jô Soares 11:30 o programa do Jô era bala). Uma vez o Abujamra falou para um convidado que disse não ter curtido Shakespeare: "Não gostastes de Shakespeare? Leia de novo. Se ainda não gostar, leia outra vez. Se tu não gostas de Shakespeare a culpa é tua. Não do Shakespeare." Eu nunca li Shakespeare, não sei se o Abujamra tem razão, mas depois de ouvir isso, até dá até vontade de ler. Mas já aviso que esse "Provocações" tem um formato que não agrada a todos, ou talvez não agrade a quase nenhum. Apesar disso, eu definitivamente recomendo, e acho o Abujamra um outro baita ator. Alguém se lembra do Ravengar?

Nota 2: Do site do Provocações: "Nesta quinta-feira, dia 18 de outubro, às 20 horas, teremos uma reapresentação especial do programa gravado em 2004 com o grande ator, recentemente falecido, Paulo Autran." 2004? Parece que foi ontem que vi essa entrevista. Vale a pena.

Pisa

Semana passada eu estive em Pisa apresentando o meu trabalho. A apresentação foi legal. Algum nervosismo inicial que desapareceu em algum momento da apresentação. Mas acho que consegui transmitir a idéia e responder tranqüilamente às perguntas que me fizeram. No restante da semana, a conferência foi boa. Com alguns trabalhos interessantes e outros nem tanto, como sempre. Agora é seguir trabalhando até a próxima conferência.

Pisa é uma cidade bem agradável. É definitivamente "mais italiana" do que Trento, mais até do que Milão e "tão italiana quanto" Roma. Quanto mais para o Sul da Itália se vai, mais "italianas" as cidades e as pessoas são, ou pelo menos mais se enquadram no estereótipo italiano que temos de fora da Itália. Tanto é que se fores para o extremo sul (Palermo, Sicilia, Calabria, Cagliari) encontras até a máfia. Gostei da "Corso Italia", uma rua bem no centro que está sempre movimentada. Gostei muito da comida toscana. Em uma das noites comemos uma "Fiorentina", sugestão do amigo italiano Marcello (que eu conhecia de Lugano). Uma Fiorentina é uma espécie de "chuleta" gigante. Mais ou menos como aqueles bifes de brontosauro do desenho dos Flintstones. É bem o meu tipo de comida. Fiorentina também pode ser o time de futebol de Florença ou uma "ragazza" nascida em Florença dependendo do contexto (ainda preciso conhecer Florença, dizem que é a cidade mais legal da Itália). Os vinhos em Pisa também, sempre excelentes. E nem precisa escolher muito. Pede-se o vinho da casa e em geral vem um vinho de boa qualidade por um preço aceitável.

Gostei também da bandeira de Pisa. Vermelha com uma cruz estilizada branca. Simples e bonita. Diversos restaurantes a ostentam e também no topo da torre de Pisa tem uma. Eu nunca vi um restaurante em Rio Grande exibir a bandeira da cidade. Embora a bandeira de Rio Grande seja feinha, na minha opinião. Não tinha cores melhores do que azul calcinha e verde?? Achei legal também o time de "calcio" local, que joga todo de vermelho, e com a tal cruz como símbolo. Quando voltei a Trento descobri que o Pisa está em primeiro lugar na serie B italiana. Já tenho time na segundona! Na série A ainda não me decidi. Só sou meio anti-Juventus. Gosto de vários dos outros times. Uma pena que não se possa ver nenhum jogo da serie A ou B na TV aberta por aqui. Uma pena também que em Trento e cidades vizinhas não haja nenhum time que preste.

Na quarta-feira teve um jantar social bancado pela conferência (ou por nossas universidades, que bancaram a inscrição nada barata). A janta foi em um antigo mosteiro, um belo prédio de mil-seiscentos-e-pouco que hoje abriga o museu de história natural de Pisa. A arquitetura do prédio é bem legal. Antes da janta conhecemos o acervo do museu que conta com diversos animais empalhados e cuja principal atração são esqueletos de baleias. Há, nada que eu não tenha visto parecido no museu oceanográfico. Mas a guia italiana falava com extrema admiração daqueles esqueletos (aos quais talvez 90% da população de Rio Grande não dê a mínima). Deu até saudade do museu oceanográfico. Depois a janta em si. Entrada com frutos do mar. Depois massa. Massa pra italiano é como arroz para brasileiro: SEMPRE tem. E depois trouxeram um javali inteiro. Um baita de um bicho em uma bandejona e encerraram com um bolo que parecia bolo de casamento, só que com o nome da conferencia escrito em cima. Tudo acompanhado de vinho branco, tinto, espumante e água mineral. Muito legal a janta. Legal também porque fiz amizade com a galera que estava na minha mesa. Uma turma de espanhóis muito gente fina (além dos amigos dos tempos de Lugano Anna e Marcello). Depois dessa janta, Pisa ficou ainda melhor pra mim, pois estar com pessoas divertidas e amigáveis é muito melhor que conhecer a cidade sozinho. Dos povos europeus com que eu tive a oportunidade de interagir, com certeza o espanhol é o mais parecido com o brasileiro.

Na última noite e na última manhã de viagem, finalmente consegui ir conhecer a torre de Pisa. A tal da torre inclinada. A torre foi construída, obviamente, para ficar na vertical, mas as fundações por volta do ano 1100 não eram apropriadas e ao longo dos anos ela foi se inclinando. Acabou sendo ótimo para a cidade, pois a torre é o símbolo de Pisa, e um dos símbolos da Itália. O local é bem agradável. Além da torre, tem uma catedral e um "batistério". Ambos prédios de bela arquitetura. Tem ainda um gramado onde muitos italianos curtiam o sol do outono pisano e muitos turistas orientais tiravam muitas fotos.

Enfim, Pisa é legal pra caramba. Recomendo!

As fotos estão no Picasa, pra variar.

segunda-feira, 15 de outubro de 2007

Livro da Vez: O Caçador de Pipas - Khaled Hosseini


Eu costumava chamar isto de "livro do mês". Acontece que eu acho que não posso cumprir o "compromisso" de ler um livro BOM por mês. Em agosto eu estava com meus pais e minha irmã, e não tive tempo de ler nada. Em setembro eu li "Neve", do autor turco Orham Pamuk que acabou de ganhar o Nobel de literatura em 2006. "Neve" é um livro interessante. Principalmente por apresentar-nos um pouco da cultura turca e os conflitos entre os costumes muçulmanos e o governo secular. Mas não achei o livro bom o bastante para colocá-lo como "livro do mês". Não que o livro seja ruim, mas não achei bom o bastante para indicá-lo aos amigos, principalmente por ser meio parado em alguns momentos de suas quase 500 páginas. Conclusão: resolvi mudar o nome do "bagulho" de "livro do mês" para "livro da vez". E aí sempre que eu tiver lido algum livro interessante eu recomendo-o. Pode ser uma vez por semana, uma vez por mês, uma vez por ano... who cares? Acho mais importante a qualidade.

Bom, vamos então ao livro da vez:

O maior mérito de "O Caçador de Pipas", de Khaled Hosseini, é ter personagens capazes de conquistar a empatia do leitor. Amir é um guri vivendo no Afeganistão dos anos 70, cujo melhor amigo é seu empregado Hassan. Esse Hassan é um "hazara", uma etnia que, aos olhos da cultura vigente, só existe para servir aos demais afegãos ("pashtuns"). A maior diversão dos dois é participar de campeonatos de pipas (ou pandorgas, como as chamamos no Rio Grande do Sul), então populares naquele país. O objetivo de tais campeonatos é ir derrubando as pandorgas dos outros caras até ser o dono da última pandorga no céu de Cabul. A vida é um mar de rosas até acontecer um evento que mudaria para sempre a vida dos dois malucos. Um tempo depois do tal evento, Amir e seu pai, em meio a invasões russas no Afeganistão acabam emigrando para os EUA. Mas as circunstâncias acabam trazendo Amir de volta ao Afeganistão anos depois, dessa vez em meio ao regime talibã, em uma tentativa de exorcizar o seu passado.

O livro é divertido, emocionante até, e "prende" o leitor. Além de mostrar um pouco da cultura do Afeganistão para o resto do mundo.

Li em outro livro (Mulheres de Cabul, de Harriet Logan), que um dos decretos do Talibã dizia simplesmente: "Pipas são proibidas". Esse "Mulheres de Cabul" também é legal. Trata-se de uma série de depoimentos de mulheres que viveram o regime Talibã. E sabe-se que as mulheres sofriam ainda mais que o restante da população com a situação. Mas eu achei mais interessante "O Caçador de Pipas".

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sexta-feira, 5 de outubro de 2007

Baita Filme


Se moras no Rio de Janeiro ou em São Paulo, corre para o cinema hoje. Se moras em outras cidades brasileiras, vai na sexta que vem. Imperdível.

Leia mais sobre o filme no Estadão.

quarta-feira, 3 de outubro de 2007

Mudança


Pois é, estou me mudando. Vou morar em Pergine Valsugana (todo mundo chama só de "Pergine"). Trata-se de uma cidade com cerca de 24 mil habitantes aqui pertinho de Trento. Pego o trem em uma estação perto do trabalho e estou em Pergine em dez minutos. O apartamento fica há uns 150 metros da estação e é grande o bastante para a minha família que eu estou tentando trazer para a Europa já há dois anos. "Eu sou brasileiro e não desisto nunca!" O aluguel é um pouco mais barato do que em Trento e, com esse trem eu chego em Pergine mais rápido do que vou da Universidade ao centro de Trento de ônibus. O único problema é que o último trem sai de Trento às 21:05, o que acaba com minhas possibilidades de fazer qualquer cooisa em Trento depois desse horário. Incluindo jantas com amigos e o futebol que eu jogava nas quartas-feiras, a menos que eu arranje alguma carona.

Mudança é um stress. Passei os últimos dias fazendo malas e encaixotando coisas. E vou passar os próximos dias desempacotando. Sem falar que por enquanto ainda não tenho água, luz e gás. Me disseram na empresa de água, eletricidade e gás (isso que é monopólio!) hoje de manhã que em dois ou três dias "deve essere tutto a posto". Tomara. Internet em casa então sabe-se lá quando (e se) vou ter.

Ainda não conheço bem Pergine, quando descobrir coisas interessantes sobre a cidade posto aqui. Parece que tem um shopping legal. O único da região que abre aos domingos! Eu sei, no Brasil tudo abre aos domingos, mas aqui isso é raro.